STJ reconhece preço vil em leilão extrajudicial e exige complementação do valor da arrematação. Entenda os fundamentos e impactos práticos dessa decisão.
- Fernanda Izzo

- 5 de nov.
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Uma recente decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) chamou a atenção de quem atua ou investe no mercado de leilão de imóveis. O tribunal reconheceu a existência de preço vil em uma arrematação extrajudicial e determinou que o arrematante seja intimado a complementar o valor pago até atingir 50% do valor de avaliação do imóvel. Caso contrário, a arrematação será anulada.
A decisão ainda não é definitiva, contudo, acende um importante alerta sobre o tema, gerando debate entre profissionais e investidores. A seguir, explico os principais pontos do caso e o que você precisa saber antes de participar de um leilão extrajudicial.
Preço vil: o que diz a lei
A definição de preço vil varia conforme o tipo de leilão:
Nos leilões judiciais, a definição vem do artigo 891 do Código de Processo Civil: preço vil é aquele inferior a 50% do valor de avaliação do bem.
Nos leilões extrajudiciais, aplica-se o determinado na Lei nº 9.514/1997 (Lei de Alienação Fiduciária): considera-se vil o preço inferior ao valor da dívida.
Nos leilões realizados em processo de falência, não temos o conceito "preço vil" como ocorre nas situações anteriores, pois aqui o objetivo é a liquidação rápida dos ativos, a fim de pagar o maior número de credores possível. Nesse sentido, a Lei nº 14.112/2020, que alterou a Lei de Falências (Lei nº 11.101/2005), que permite a arrematação ainda que o valor seja muito inferior à avaliação do imóvel, neste sentido o Informativo 863 do STJ.
É importante observar que o conceito de preço vil vai variar conforme o tipo de leilão em razão do princípio da especialidade, segundo o qual a lei específica deve prevalecer sobre a lei geral.
É por isso que a decisão do STJ gera controvérsia, ao aplicar o critério do CPC em um leilão regido por norma própria.
O caso analisado pelo STJ
O julgamento envolveu um leilão extrajudicial, realizado por uma instituição financeira no contexto de alienação fiduciária. Conforme informado acima, nessa modalidade se aplica a Lei nº 9.514/1997, que regula os contratos de alienação fiduciária de bens imóveis.
De acordo com o artigo 27, §2º dessa lei, considera-se vil o preço inferior ao valor da dívida, e somente quando não houver lance que alcance o valor da dívida, é facultado ao credor fiduciário a aceitação de lance que corresponda a pelo menos 50% do valor de avaliação, senão vejamos:
Art. 27. Consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário promoverá leilão público para a alienação do imóvel, no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da data do registro de que trata o § 7º do art. 26 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023) (...)
§ 2º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que seja igual ou superior ao valor integral da dívida garantida pela alienação fiduciária, das despesas, inclusive emolumentos cartorários, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais, podendo, caso não haja lance que alcance referido valor, ser aceito pelo credor fiduciário, a seu exclusivo critério, lance que corresponda a, pelo menos, metade do valor de avaliação do bem.
Em sua Decisão, o STJ reconhece que a lei de alienação fiduciária permite a arrematação do imóvel pelo valor da dívida, entretanto, reforma a Decisão prolatada pelo Tribunal local, que entendeu a ausência de 'lacuna para aplicação subsidiária das normas gerais do Código de Processo Civil'.
No julgamento do AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 2165101 - PR (2022/0209712-3), ocorrido em 30 de setembro de 2025, o STJ aplica o conceito de preço vil, como aquele inferior a 50% do valor de avaliação, ainda em se tratando de leilão extrajudicial:
Com efeito, a conclusão adotada pela Corte de origem está em dissonância com a jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que, muito embora o artigo 27, § 2º, da Lei n. 9514/97 autorize a venda do imóvel em segundo leilão pelo valor da dívida, a arrematação não poderá ser realizada por preço vil, assim considerado aquele inferior a 50% (cinquenta por cento) do valor de avaliação, sob pena de causar um prejuízo exagerado em desfavor do devedor fiduciante. (...)
O imóvel foi avaliado em R$ 870.993,08 e arrematado em 2º leilão por R$ 346.400,00, abaixo de 50% da avaliação, restando caracterizada, portanto, a arrematação por preço vil.
Foi determinada, ainda, a intimação do arrematante para complementar o valor ofertado, acrescido das correções legais, de maneira a alcançar 50% do valor de avaliação do imóvel, fixando que a compra será desfeita caso contrário. A Decisão ainda não é definitiva.
Por que a decisão é polêmica
Ao aplicar o conceito de preço vil do CPC em um leilão extrajudicial, o STJ acaba relativizando o princípio da especialidade. Na prática, a decisão mistura regras de sistemas jurídicos diferentes, o que pode gerar insegurança jurídica e afetar a previsibilidade do mercado de leilões.
Por outro lado, a decisão também reflete uma preocupação do Judiciário em evitar negócios desproporcionais, nos quais o imóvel é arrematado por um valor muito inferior ao seu real valor de mercado.
O que o investidor deve observar
Mesmo que a decisão não altere automaticamente a regra geral, ela abre precedente e mostra que o Judiciário pode intervir quando o valor de arrematação for considerado muito baixo.
Por isso, antes de participar de um leilão, é fundamental que o investidor confira qual legislação se aplica à modalidade de leilão escolhida, e que confira tanto o valor de avaliação do imóvel como o valor da dívida, comparando-os ao valor mínimo que foi estipulado para os lances.
Se houver diferença significativa entre o valor mínimo do lance e o valor de avaliação, isso não significa necessariamente que a oportunidade deva ser descartada. No entanto, é importante avaliar o risco de questionamentos futuros, especialmente à luz da jurisprudência atual sobre o tema.
O investidor precisa ponderar se vale a pena participar do leilão diante da possibilidade de embargos ou discussões judiciais, que costumam ser longas e custosas. Em muitos casos, mesmo obtendo vitória ao final, o comprador pode ter o capital imobilizado por anos, e consequentemente, perder o rendimento do investimento.
A importância da análise de risco
Participar de um leilão de imóveis pode representar uma excelente oportunidade, mas também
envolve riscos que precisam ser cuidadosamente avaliados. A análise de risco é essencial nesse processo, pois permite identificar e antecipar problemas que possam causar prejuízos, garantindo decisões mais seguras e estratégicas.
Na prática, o objetivo da análise de risco não é impedir o arrematante de participar do leilão, muito pelo contrário. Ela serve para trazer clareza e previsibilidade ao negócio, oferecendo um diagnóstico técnico sobre a viabilidade da arrematação.
Com base nessas informações o investidor pode se planejar melhor, decidir de forma consciente e escolher quais riscos está disposto a assumir.
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